sexta-feira, 17 de março de 2017

Cinema, a Arte de contar histórias com imagens em movimento

 
Porque contamos histórias

O filósofo Alemão existencialista Schopenhauer propôs, no Séc. XIX, uma resposta para o porquê de o Homem, ao contrário dos restantes animais, questionar o propósito da sua existência e da sua tecnologia. Segundo o mesmo, a tomada de consciência da inevitabilidade da morte terá efetuado alterações suficientes na psique humana de então para que instinto e intelecto deixassem de caminhar em harmoniosa e paralela sintonia, como acontecia nos restantes animais, cujo instinto parecia bastar como justificação da sua existência (SCHOPENHAUER, 1939: 17).

Assim, é possível perceber que o homem encontrou no aperfeiçoamento das tecnologias uma forma de prolongar e facilitar a sua existência biológica, e no desenvolvimento da linguagem e na criação artística, formas de, simbolicamente, se imortalizar no tempo, através do conhecimento e da memória. (HUXLEY, 2008: 43) É possível reconhecer que, de facto, o ato de contar histórias, o desenvolvimento da linguagem e sistemas simbólicos, e a criação artística constituíram-se como fatores fundamentais na preservação e amadurecimento do conhecimento ao longo das gerações (HUXLEY, 2008: 43).

Embora a discussão em torno da definição de “Arte” e o seu objetivo social seja muito polémica dentro do campo da Estética, existindo diversas e distintas posições e escolas, podemos, uma vez que estamos a falar de Cinema, citar Eisenstein para percebermos qual a sua função. Assim, Eisenstein propõe que o objetivo da arte passa por:

“(...)tornar manifestas as contradições do Ser. Formar visões justas despertando contradições na mente do espectador, e forjar conceitos intelectuais acurados a partir do choque dinâmico de paixões opostas. (...) sua natureza é um conflito entre a existência natural e a tendência criativa.” (EISENSTEIN, 2002: 50)

Assim, considera-se que no cerne de toda a premissa artística está uma vontade de criar um conflito de qualquer natureza, seja formal - na pintura e escultura - seja sonoro - na música - seja espacial - na arquitetura - seja narrativo - na literatura e no teatro - ou sejam todos esses - no Cinema.

Ora um conflito pode ser entendido, essencialmente, como uma variação de tensões, ou como Eisenstein diz, “um choque dinâmico de paixões opostas” (EISENSTEIN, 2002: 50). O dinamismo que resulta de tal conflito é ditado, por um lado, pelas características físicas particulares e inerentes a cada médium artístico, e por outro, pelo tratamento que o artista dá a cada componente expressivo, pela forma como o mesmo organiza e apresenta tal conflito.

Assim, entendemos que a base de qualquer discurso e objeto artísticos assenta na criação de um conflito, conflito esse que é construído a partir da variação de tensões expressivas, em concordância com as intenções comunicacionais e artísticas do criador. Ora o conflito, por sua vez, é também a base de qualquer narrativa e história (FIELD, 2001: 15).

O Cinema, enquanto meio de expressão e transmissão de ideias, pensamentos e emoções sob uma forma estética altamente elaborada na qual predomina o agenciamento das imagens em movimento transformadas em sistemas de signos e de símbolos (GEADA, 1987: 174), afigura-se então como a primeira nova linguagem artística a surgir num contexto moderno, urgindo a necessidade de esquematizar os seus recursos expressivos e, a partir daí, construir as suas gramáticas.

Fonte: Texto retirado da dissertação de mestrado A Narrativa Visual de Miguel Ângelo Durães Pereira

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